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música que respira junto à cidade

  • larissashanti
  • 25 de jun.
  • 3 min de leitura

Por trás de cada nota, existe uma pausa. Um silêncio. Um corpo inteiro escutando a outro. Em Florianópolis, a Orquestra de Cordas da Ilha não toca apenas partituras: toca gente.


Para quem acha que música erudita é “difícil” ou “não é pra mim”, Paulo Mattos, contrabaixista, diretor e idealizador da Orquestra, tem uma sugestão simples: feche os olhos e apenas escute.


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“Não é sobre entender. É sobre sentir. O som ressoa com algo que está dentro de nós. Mesmo que você não saiba o nome da obra ou do compositor, se estiver presente, vai sentir”.

É assim que, desde 2005, a OCI (como carinhosamente é chamada) vem trilhando um caminho particular dentro do cenário musical brasileiro. Durante esta trajetória, desafiou rótulos, misturou tradição à experimentação e apostou na força do coletivo. Com 11 músicos e sem maestro, a OCI funciona como um organismo vivo. “É como se os corações batessem no mesmo ritmo. A gente se escuta de verdade. A energia é construída no olhar, no gesto, na respiração”.


Quando o silêncio também toca

Paulo conta que tocar exige muito mais do que habilidade técnica: “É concentração máxima, mas também é corpo, é tensão e relaxamento, quase como uma coreografia. Às vezes, o silêncio entre as notas diz mais do que a própria melodia”. Há uma pausa precisa que não é vazia: é cheia de intenção. E, quando a pausa tange, é impossível não se arrepiar.


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Uma orquestra “de” e “para” Florianópolis

Fazer música clássica em Floripa pode parecer um contrassenso; mas Paulo acredita ser o contrário: “A cidade é múltipla, viva, e isso inspira a gente. As paisagens, a luz, o mar, o silêncio da lagoa, tudo isso influencia na forma como tocamos. Tem uma energia aqui que toca junto ao som”.

A orquestra, ao longo dos anos, desenvolveu uma identidade própria. O repertório é renovado constantemente, evitando que as obras percam o frescor. “Uma das vantagens da música erudita é que o repertório é inesgotável. Tem sempre algo novo pra descobrir, mesmo em obras antigas”.


Música para todos os ouvidos

O que torna a OCI ainda mais especial é o desejo de levar a música além dos palcos tradicionais. Através de apresentações em escolas, comunidades ribeirinhas, bairros periféricos… eles têm espalhado esse som único com paixão. Sempre com o mesmo brilho nos olhos.

“É muito forte ver alguém que talvez nunca tenha visto uma orquestra ao vivo se emocionar. Às vezes, ali, nasce um músico, às vezes só nasce um encantamento novo; os dois são lindos”.

Paulo lembra que ele mesmo decidiu estudar música depois de assistir a uma apresentação da sua banda favorita: “Uma única apresentação pode mudar uma vida. Eu sou prova disso”.


Paulo Mattos
Paulo Mattos

A música que se mistura

Apesar de todo o respeito à tradição, a Orquestra de Cordas da Ilha nunca se isolou num pedestal. Muito pelo contrário. Já se apresentou ao lado de artistas populares, músicos de jazz e instrumentistas regionais. “Os instrumentos da música erudita se adaptam lindamente a outros gêneros. Nõs não perdemos a alma quando nos misturamos; nós expandimos”.

Não por acaso, já fizeram parcerias com bandas de rock progressivo, e seguem abertos a novas fusões. O segredo, segundo Paulo, é escutar: escutar o outro, escutar a cidade, escutar o tempo.


Entre calos e emoção

Perguntamos o que mudou entre o Paulo iniciante e o músico que há quase 20 anos lidera a OCI. Ele respondeu com simplicidade: “O corpo se molda ao instrumento. Antigamente, o professor sabia se o aluno estudava só de olhar os calos na mão. Hoje, com a tecnologia, isso mudou. Mas a dedicação continua sendo diária, assim como no esporte. A emoção também. Aquele frio na barriga antes de entrar no palco… ainda dá. E é bom”.


Um convite silencioso

Se você acha que música clássica não é pra você, talvez seja só porque ainda não parou pra ouvir. Não com os ouvidos, mas com o corpo todo; com o tempo e o silêncio que ela merece.

Talvez você se emocione com um adagio de Eduard Franck. Talvez sinta vontade de dançar com o “batuque” de Francisca Aquino. Talvez nem saiba o nome da música, mas sentirá algo dentro de você sendo tocado.

É isso que importa.


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